terça-feira, 25 de outubro de 2011

Luiza Erundina dá uma aula aos que querem ver o passado enterrado

sábado, 22 de outubro de 2011

 http://www.pragmatismopolitico.com.br/2011/10/luiza-erundina-da-uma-aula-aos-que.html

 

Os que cometeram crimes de lesa-humanidade, crimes de tortura, de desaparecimentos forçados, de mortes, em nome do Estado, estão impunes até hoje. Desenterrar o passado, portanto, lhes causa medo

 

Elzita Santa Cruz, 97 anos, até hoje espera
reencontrar seu filho desaparecido na ditadura
A pernambucana Elzita Santa Cruz (foto ao lado), de 97 anos, não muda de casa nem de telefone porque acredita  que a qualquer momento chegará uma notícia sobre o filho Fernando, desaparecido aos 25 anos, na ditadura militar. Prêmio Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República por causa de sua luta, Elzita declarou apoio eleitoral à presidenta Dilma Rousseff em 2010. Na época, escreveu à candidata que Lula avançou pouco, mas tinha a “certeza” de que ela, eleita, não pouparia esforços para descobrir o paradeiro dos desaparecidos políticos do País.
 
 
A paraibana Luiza Erundina, de 77 anos, deputada federal pelo PSB, é uma das mais firmes referências nacionais na luta pela redemocratização do Brasil. Mas embarga a voz quando lembra de dona Elzita. Erundina está convencida de que o governo Dilma não dará conta da expectativa da amiga pernambucana. “Temo que esse arremedo de Comissão da Verdade e as meias verdades, que ela eventualmente possa apurar terminem acabando com a causa e o ânimo das pessoas.” As pessoas vão morrendo e as memórias, quando não preservadas, se apagam
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Erundina conta que se entristece porque toda a luta das donas Elzitas não foi suficiente para que o Brasil criasse mecanismos que impeçam essa história de se repetir, seja como farsa, seja como tragédia. Nem de fazer realmente sua democratização. “Aqueles que patrocinaram a ditadura ainda estão no poder.”

Confira a excelente entrevista concedida a revista CartaCapital:
CC: O Brasil terá uma Comissão da Verdade ou da Meia Verdade?
Luiza Erundina: Se o projeto aprovado na Câmara se mantiver nos mesmos termos, não há perspectivas de um resultado concreto ou justo em relação aos crimes e aos responsáveis por eles na ditadura. É insuficiente e inadequado. Por exemplo, o prazo das investigações, de 1946 a 1988, é muito amplo, pega desde a ditadura Vargas. E para apenas sete integrantes investigarem em dois anos. Os membros são escolhidos pela presidenta, sem nenhum mecanismo de consulta. A comissão não tem autonomia orçamentária, é totalmente subordinada à Casa Civil. Prevê a possibilidade de militares integrarem a comissão. E não se conseguiu mudar a interpretação da Lei da Anistia. Então não será feita Justiça.
CC: E há a condenação da Corte Interamericana…
LE:  Sim. Em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, no julgamento do caso da Guerrilha do Araguaia, condenou o Brasil a uma série de medidas de investigação, identificação dos responsáveis e da memória e da verdade sobre os crimes e exigiu, entre outras coisas, que a Lei da Anistia tenha outra interpretação. Na interpretação da OEA, a Lei da Anistia, de 1979, afetou o dever do Estado de investigar e punir. Então, a Ordem dos Advogados do Brasil entrou com uma ação no STF, requerendo um parecer nos termos exigidos pela OEA. E o STF decidiu, no fim de 2010, pela manutenção da interpretação atual.
Deputada luta pela aprovação de uma Comissão justa
CC: A senhora tem um projeto na Câmara para mudar isso, não?
LE: Sim, porque, como a lei atual está, mesmo que essa Comissão da Verdade venha a descobrir provas de assassinatos, os criminosos ficarão impunes, por causa da interpretação do STF. E o projeto de lei do governo Lula, apresentado em maio de 2010, para criar a Comissão da Verdade, foi retirado e aprovado no fim de uma sessão à noite, em regime de urgência urgentíssima, o que limitou ainda mais a possibilidade de se apresentarem emendas. O governo fez um rolo compressor para que o projeto fosse apresentado nesses termos. E negociaram com a oposição algumas emendas. Mas recusaram emendas de avanço.
CC: Qual o interesse do governo em aprovar a Comissão dessa forma?
LE: O que ouvimos é que ou se aprovava a proposta nos termos em que ela estava ou haveria dificuldades em razão da pressão da área militar. E que os termos teriam sido negociados pelo então ministro Nelson Jobim com a área militar. Assim, essa proposta que acabou apresentada pelo Lula foi para diluir a luta.
CC: Depois não houve só uma ação da direita, mas o próprio governo articulou contra o seu projeto…
LE: Sem dúvida. A defesa que os representantes do governo fizeram, na companhia, inclusive, de parlamentares ditos de esquerda, comunistas, alguns que até foram vítimas também… Olha, é inexplicável. Mas o governo baixou o rolo compressor nesse caso também. E outra coisa: conseguimos aprovar requerimentos da Comissão de Direitos Humanos da Câmara para fazer duas audiências públicas, uma sobre a Comissão da Verdade e a sentença da OEA e outra sobre o caso do Araguaia. E convidamos os ministros dos Direitos Humanos (Maria do Rosário), da Justiça (José Eduardo Cardozo) e das Relações Exteriores (Antonio Patriota). Eles absolutamente não compareceram. É muito frustrante. Acho que é simplesmente para se encerrar a discussão, para dar uma resposta meio enviesada à Corte da OEA. Agora, se a pressão crescer, pode ser que a comissão sirva para alguma coisa.
CC: Da forma como está, a Comissão da Verdade não corre o risco de enterrar a história, ao contrário de atender à decisão da OEA?
LE: Sim. O objetivo expresso no texto do projeto é resgatar a memória para ver a verdade histórica e fazer a reconciliação nacional. Sem tocar em justiça. É incrível, pois todos os países que sofreram ditaduras tiveram comissões da verdade com a perspectiva de fazer justiça: Argentina, Uruguai, África, Alemanha. A nossa preocupação é exatamente essa. A Comissão, tão cercada de cuidados para se enxergar a verdade por inteiro, pode ser pior que nada… Não dá para identificar responsáveis de crimes e não levá-los à Justiça. Temo que esse arremedo de -Comissão da Verdade, com as meias-verdades que, eventualmente, possam ser apuradas, acabe com a causa e o ânimo das pessoas. Têm familiares que ainda vivem sob a expectativa de informações sobre aqueles que se envolveram -naquele processo. Há o caso do Fernando Santa Cruz, por exemplo, cuja mãe, dona Elzita Santa Cruz, de 97 anos, ainda espera. Muitos filhos dela sofreram prisões, torturas, mas o Fernando desapareceu no Rio de Janeiro e até hoje não há nenhum sinal dele. E a mãe, tão velhinha, quase 100 anos, mora na mesma casa em Pernambuco, e não concorda em sair de lá, embora a casa tenha muitas escadas que lhe prejudicam a mobilidade, porque ela acha que precisa ficar lá porque, se o filho aparecer, saberá onde ela está. Ela não permite, por exemplo, a mudança o número do seu telefone, porque todas as vezes que ele toca, o coraçãozinho dela palpita, pensando que é o filho. É uma tortura. E assim há centenas de casos de pessoas que continuam com suas feridas abertas, querendo saber onde estão as ossadas. Ora, ao menos uma satisfação é devida. Pior que a morte é o desaparecimento. E não há essa perspectiva de se chegar à verdade. Acho muito duro e injusto.
CC: Muitos são contra, acham que é preciso enterrar o passado. O que dizer a eles?
LE: Os que são contra apurar a verdade e fazer justiça alegam que também os opositores da ditadura cometeram crimes. Só que, nesse caso, eles pagaram: com condenações, processos, prisões, torturas, punições severas pela Lei de Segurança Nacional. Não é verdade que os dois lados tiveram o mesmo tratamento. Só os que cometeram crimes de lesa-humanidade, crimes de tortura, de desaparecimentos forçados, de mortes, em nome do Estado, estão impunes até hoje. Essa verdade que vai chegar por meio dessa comissão, se é que se chegará a alguma, vai ser para quê? Só para a memória? Olha, é preciso que seja mais até para o Brasil concluir sua democratização. Porque, enquanto não se virar essa página, passar aquele período a limpo, a redemocratização ficará incompleta.
CC: Uma vez a senhora disse que a ditadura militar caiu de podre e não por uma resistência. Logo não houve uma ruptura com o regime que desse início à democracia…
LE: Hoje, os que patrocinaram a ditadura ainda estão no poder. Ainda são as mesmas forças. É só olhar quem está no Congresso, nas instituições políticas.
CC: Há ainda algum caminho para que seu projeto possa chegar ao plenário?
LE: Ele deveria ter sido distribuído para a Comissão de Justiça e Cidadania, mas a Comissão de Relações Exteriores e Segurança Nacional requereu que a matéria fosse para aquela comissão. Já havia uma clara intenção. Agora vai para decisão da Comissão de Justiça e Cidadania. Não vamos deixar de lutar, não. Se for aprovada na CCJ, vai para o Plenário da Câmara. Se não, morre.
CC: Na sua avaliação, haverá ainda outros mecanismos possíveis para que o Brasil possa realmente conhecer suas verdades?
LE: Acho muito difícil. O tempo passa, os mais diretamente interessados vão morrendo. O ânimo de luta se arrefece, a memória se distancia, as novas gerações não viveram aquilo e no Brasil não há uma cultura de se preservar a memória e de se levar os jovens a conhecerem a história. É só um repetido: “Vamos esquecer, para quê revanche…”.
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CC: O que o Brasil dirá à OEA até dezembro, quando vence o prazo para a sentença?
LE: O Brasil tem responsabilidades no plano mundial sobre sua posição a respeito dessas coisas. Integra a OEA e é signatário dos direitos humanos. Fica muito mal politicamente. O que não sabemos é se a Corte se satisfará apenas com essas providências, mas, mesmo que sim, certamente os autores da ação vão querer protestar. A gente continuará lutando porque essa causa é perene. Ela serve para evitar outros crimes como aqueles. Não é uma coisa menor. Não é “revanche” ou “para que isso, se faz tanto tempo”. Não é assim. A tortura no Brasil hoje é uma rotina nas cadeias, nos distritos policiais. A reação ainda é “direitos humanos para bandidos não” porque não se preserva a memória. É preciso mostrar o que aconteceu para conseguirmos preservar a democracia.
 

2 comentários:

  1. os militares nao eram nem um monstro que tanto falam até hoje,eram apenas cidadoes comum iguaizinhos aos de hoje,porem eram verdadeiros HOMENS que simplesmente tomavam conta de verdade deste PAIS que hoje se tornou uma verdadeira fossa de DEPRAVADOS,LADROES e ASSASSINOS garantidos por leis que nao funcionavam nos aureos tempos,o povo trabalhador e honesto atravessou o regime sem serem incomodado, agora para se igualar a esse regime de DESONESTOS e assassinos o R.M. teria de permanecer 400 anos... a OCASIAO FAZ o LADRÃO VIVA BRASIL!!!

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  2. dizer que torturador é gente honesta que apenas estava tomando conta do país, mesmo depois de pretensamente ter lido o artigo acima, é a prova cabal da alienação e falta total de noção de algumas pessoas

    e ainda achamos que Ditadura era coisa do passado
    mas os ditadores continuam "expressando" sua "verdades"

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